sábado, 17 de novembro de 2012

Tradição e Talento Individual: a janela de Eliot

T.S ELIOT (1888-1965)


Por Jaciene Andrade

Quais os limites da individualidade do artista e até que ponto as forças da tradição agem sobre a sua obra? Essa indagação motiva o Projeto de Pesquisa Janela de Tomar a investigar a presença de elementos da tradição ocidental nas literaturas portuguesa e brasileira produzidas entre o século XIX e a contemporaneidade. O encadeamento das obras literárias segue uma lógica de recriações das matrizes culturais, ainda que nem sempre fiquem explicitadas no texto. 

No ensaio “Tradição e talento individual”, publicado em 1920, o crítico literário e poeta T. S. Eliot reflete sobre tais questões diante da tendência geral de se buscar no artista, como saudável, os elementos que o diferenciam de seus antecessores, a marca individual. Porém, segundo Eliot, pode acontecer de, exatamente nas passagens consideradas mais individuais, encontrarmos as vozes de outrora que continuam embasando os discursos do presente. Ou seja, o que fundamenta a teoria de Eliot – e embasa os rumos deste Projeto – é a afirmativa de que a tradição se infiltra no texto literário, mesmo nos espaços mais supostamente individuais.
Para o ensaísta, a tradição é sempre fruto de um esforço. O artista que empreende tal esforço consegue ser tradicional, o que significa ter a percepção da distância e proximidade do passado, reunindo sentimentos atemporais ao tempo em que vive. Por isso, o autor afirma não existir obra de arte desvinculada das relações de contraste e comparação com outras. Uma comparação que se exige não-harmônica, já que toda obra de arte também se define pela novidade. Por isso, a tradição vai muito além da repetição, ela é o desenvolvimento do sentido histórico, da consciência do passado.
Segundo Eliot, o poeta é aquele que bem desenvolveu essa consciência, compreendendo o passado como elemento que modifica o presente, pelo qual é orientado. Tendo uma personalidade, o poeta não a imprime em sua obra. A mente do artista catalisa emoções e sentimentos, possibilitando novas combinações que não estarão necessariamente presas às palavras, mas, disponíveis, sobrevoando o universo do texto. 
Separado o homem de sua mente criadora, a tradição, formada por uma mentalidade coletiva que se sobrepõe e se mistura à individual, dá vazão a diálogos com a ancestralidade, como ocorre no poema do próprio Eliot “The Waste Land”. Nele, é nítida a presença da tradição, já que o poema remete ao ato de escavar, trazendo à tona a memória da humanidade. The Waste Land é o poema da teoria eliotiana. Os fragmentos que escoram suas ruínas, parafraseando o poeta, mostram que o presente é feito com base em sucessivas recordações do passado. Uma tradição mais forte do que o artista.


Referências:
ELIOT, T. S. Tradição e talento individual. In: ______. Ensaios. Tradução: Ivan Junqueira. Rio de Janeiro: Art Editora, 1989.

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